Quarta-feira, 29 de Dezembro de 2004

Strings

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Podia ontem ter tido todo o poder em meus braços. A cobardia e a comodidade invadiram-me, ou então simplesmente não quis que tu me visses em meu deslumbramento de carne. A carne ficaria molhada e a casa-de-banho espera-me, ou o sofá, ou a carne.
Máscara.
Unicidade.
Lamber.
Humidade.
Entrega.
Rainha.

“Cada homem mata aquilo que ama”, irrefutável. Sinto assim um âmago estranho e que me enclausura dentro de uma muralha negra, dura, feita de tecido manchado de sangue derramado por mim em tons de outros.
Ficarei em silêncio à espera que descer. Vou-me cobrir de mim. Usar-me nesta estranha forma de amor. “Start, Stop, Mute”. Envolver-me na melodia, rodear-me de notas, de harmonias completamente loucas e desgrenhadas, ansiar tudo isto e mais alguma coisa, sussurrar-me, gritar-me.

Passaram dias de vazio. Repleta de dor assim me encontro. Escavei vales na minha cara de tantas serem as lágrimas que percorreram o amargo caminho por onde me deixei levar. Apetece-me sentir coisas que já senti.

Dizem-me para lutar, que só com luta consigo atingir os meus objectivos…que ironia! Foram vocês que me roubaram o sonho, que me deixaram assim, apática! Ou fui eu? Oh que confusão…as minhas extremidades prendem-me, enclausuram-me em mim…viajo numa descida alucinante da tensão arterial, ansiando que fique a zero, e assim possa ser livre.
Dinheiro…que condição…as pálpebras pesam, os dedos gesticulam, doridos…o âmago sobressalta…cigarros…quero afundar-me em álcool…não sinto…que ódio…quem quero enganar? “i got a date with suicide”…mais cedo ou mais tarde terei de…
Caminho descalça por tenras planícies, virgens de mim e da minha condição. Sinto o vento saltitar entre as minhas pernas despidas, a enrolar-me o cabelo, a secar-me os lábios. Deixo os braços voarem em direcção ao céu, pedindo um amigo…uma paixão…um sentimento…ajoelhei-me perante a Rainha e senti o seu corpo: a terra, rija como sempre, a erva, fácil de quebrar, e os espinhos, que se cravavam em mim. Apeteceu-me fechar os olhos para poder sentir cada ponto em mim a extasiar-se com tudo isto. A misericórdia. Ergui-me e tornei a caminhar, de olhos ainda fechados. Senti que a planície estava provavelmente a acabar, já que o corpo inclinava ligeiramente para trás. Deslumbramento. Água. Tirei o velho farrapo que pouco me tapava o corpo, e decidi ligar-me mais a esta miragem…na baldia praça do centro…andei em direcção à deusa, e nadei para ela, para esquecer. Drogas…

Sinto-me a acordar. Desperta-me um shake de ódio, solidão e tristeza. Por onde viajei? Não consigo expressar-me…toda a expressividade está a transformar-se em água, salgada e a molhar-me o rosto…
Apetece-me viajar sozinha. Soltar as amarras de todos e ficar apenas com a lembrança…agora que me penso…será que se lembrariam de mim? Julgo que não…afinal quem sou eu?
Viajaria para conhecer, e para me conhecer principalmente. Dessa forma poderia tomar todo o álcool, toda a droga, toda a homossexualidade, toda a orgia, toda a harmonia, toda a vida que me apetece sentir…ficaria louca de mim…sentir-me-ía uma personagem de um livro que amo…especial? Apenas livre. Sinto-me a cair…já não estou cá há tanto tempo…


(Imagem de André Brito. www.andrebrito.com)



publicado por Rute às 19:18
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De docerebelde a 30 de Dezembro de 2004 às 20:40
Tanto desânimo há no teu texto!!!. Se foi real todo este sofrimento, conseguiste transmitir na integra, se foi ficção , felicito-te pela forma como o descreveste.Excelente...!
Um 2005 recheado de muita paz, fé e esperança!


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