Amarraram-me ao chão. No meio de nada, cheia de lama. Sinto a força das correntes que não me deixam contrair o suficiente. Deitada aqui, farta de espernear, paro e penso. Analiso as tuas palavras, o teu olhar. Revejo-me e desejo.
Aglutino tudo. As vísceras contraem-se repetidamente numa batida paralela ao coração que me faz tremer, suar um pouco e prolongar o minuto até ao arrastamento das horas não o suportar mais. Até ter de fechar os olhos.
Estão a crescer raízes de dentro de mim em direcção ao céu. Raízes que vão fazer crescer a planta que não deviam, raízes que nasceram ao contrário, que vão crescer ao contrário de todas as outras. Raízes sôfregas, que se prolongam até onde queiras
até que decidas não regar mais esta planta desnutrida de vida
Pinto os lábios de sedução. Trago um sorriso no canto dos lábios, quase sempre pronto para ti. Mas tens de me desamarrar primeiro
vá lá
anda, caminha para mim.
Acordo de um sono pouco profundo numa noite esbelta.
Na réstia de um toque delicado, definho.
Reencontro-me em temperaturas escaldantes, pedaços soltos e agudos de harmonias que me escorrem pela pele.
Afunilo-me para a espera do sorriso anunciado e sem o desmentir, corro para ele. Como se nada importasse
Como se nada importasse mesmo.
(Ergui-me da cama e ofereci às mãos as palavras que me assaltam a mente antes de adormecer. Costumo tentar perpetuá-las em qualquer pedaço de papel amarrotado que a alma pensa encontrar, agradece o descanso, e engana-se.)
Ainda sinto o ardor, a queimar, a percorrer libertino o caminho da vida, deixando-me adocicada de sons. Pouco mais e sou pena flutuante a caminho do horizonte, em busca da luz perdida por pouco mais tempo.
Hei-de sentir. Que prazer! Escrever ao sabor dos dedos, nada preocupados com a beleza arredondada das letras. Que prazer! Escrever, deslizando suavemente a esferográfica pelo pensamento pouco incomodado pelos condicionamentos dos seus similares. Livre.
A calma que me enche a casa e o peito esgotariam todas as cargas de esferográficas que tenho por aqui
Sinto-a plena, bela, esgotante em palavras. Uma maratona imperdível para prolongar agora e por outros dias
Não estou esgotada mas de súbito apetece-me o conforto dos lençóis. Deve ser por me ter lembrado da falta que tenho do teu.
(Imagem de Marcin Klepacki)