Podia ontem ter tido todo o poder em meus braços. A cobardia e a comodidade invadiram-me, ou então simplesmente não quis que tu me visses em meu deslumbramento de carne. A carne ficaria molhada e a casa-de-banho espera-me, ou o sofá, ou a carne.
Máscara.
Unicidade.
Lamber.
Humidade.
Entrega.
Rainha.
Cada homem mata aquilo que ama, irrefutável. Sinto assim um âmago estranho e que me enclausura dentro de uma muralha negra, dura, feita de tecido manchado de sangue derramado por mim em tons de outros.
Ficarei em silêncio à espera que descer. Vou-me cobrir de mim. Usar-me nesta estranha forma de amor. Start, Stop, Mute. Envolver-me na melodia, rodear-me de notas, de harmonias completamente loucas e desgrenhadas, ansiar tudo isto e mais alguma coisa, sussurrar-me, gritar-me.
Passaram dias de vazio. Repleta de dor assim me encontro. Escavei vales na minha cara de tantas serem as lágrimas que percorreram o amargo caminho por onde me deixei levar. Apetece-me sentir coisas que já senti.
Dizem-me para lutar, que só com luta consigo atingir os meus objectivos
que ironia! Foram vocês que me roubaram o sonho, que me deixaram assim, apática! Ou fui eu? Oh que confusão
as minhas extremidades prendem-me, enclausuram-me em mim
viajo numa descida alucinante da tensão arterial, ansiando que fique a zero, e assim possa ser livre.
Dinheiro
que condição
as pálpebras pesam, os dedos gesticulam, doridos
o âmago sobressalta
cigarros
quero afundar-me em álcool
não sinto
que ódio
quem quero enganar? i got a date with suicide
mais cedo ou mais tarde terei de
Caminho descalça por tenras planícies, virgens de mim e da minha condição. Sinto o vento saltitar entre as minhas pernas despidas, a enrolar-me o cabelo, a secar-me os lábios. Deixo os braços voarem em direcção ao céu, pedindo um amigo
uma paixão
um sentimento
ajoelhei-me perante a Rainha e senti o seu corpo: a terra, rija como sempre, a erva, fácil de quebrar, e os espinhos, que se cravavam em mim. Apeteceu-me fechar os olhos para poder sentir cada ponto em mim a extasiar-se com tudo isto. A misericórdia. Ergui-me e tornei a caminhar, de olhos ainda fechados. Senti que a planície estava provavelmente a acabar, já que o corpo inclinava ligeiramente para trás. Deslumbramento. Água. Tirei o velho farrapo que pouco me tapava o corpo, e decidi ligar-me mais a esta miragem
na baldia praça do centro
andei em direcção à deusa, e nadei para ela, para esquecer. Drogas
Sinto-me a acordar. Desperta-me um shake de ódio, solidão e tristeza. Por onde viajei? Não consigo expressar-me
toda a expressividade está a transformar-se em água, salgada e a molhar-me o rosto
Apetece-me viajar sozinha. Soltar as amarras de todos e ficar apenas com a lembrança
agora que me penso
será que se lembrariam de mim? Julgo que não
afinal quem sou eu?
Viajaria para conhecer, e para me conhecer principalmente. Dessa forma poderia tomar todo o álcool, toda a droga, toda a homossexualidade, toda a orgia, toda a harmonia, toda a vida que me apetece sentir
ficaria louca de mim
sentir-me-ía uma personagem de um livro que amo
especial? Apenas livre. Sinto-me a cair
já não estou cá há tanto tempo
(Imagem de André Brito. www.andrebrito.com)